Perto da casinha de sapê, há um pequeno
mercado, comprado recentemente por uma família chinesa. O Rogério
de Moura, médium cinematográfico que me incorpora, tem muitas
dificuldades em se comunicar com os chineses na hora de comprar algo.
Tanto que elaborou um mini-dicionário ching-ling-portuga.
Com a regra das sacolinhas, podemos fingir que salvamos o planeta.
Eis alguns verbetes:
Socrinha - Sacolinha
Possi Nhu - Pãozinho
Tadera - Mortadela
Musera - Mussarela
Lau - Real
Intchávo - Centavo
Possi Nhu - Pãozinho
Tadera - Mortadela
Musera - Mussarela
Lau - Real
Intchávo - Centavo
Tacora - Coca-Cola
Seja - Cerveja
Shasha - Cachaça
Estava relembrando essa lista quando o Rogério
entrou, praguejando insultos, chutando pedras imaginárias, enquanto equilibrava
nas mãos uma embalagem com papel higiênico, um frasco de detergente
e um saco de pãezinhos.
Segundo resolução de todos os supermercados, nada
mais de sacolinhas de plástico, à base de petróleo. O problema dessa
resolução é que ela pressupõe que todos que saiam de casa estão
indo ao supermercado. O que não acontece com pelo menos oitenta
por cento dos casos. Como no caso do Rogério. Depois de um retorno
de Higienópolis, onde gente diferenciada não entra, ou entra sob
o olhar desconfiado de vigilantes e seguranças, decidiu, no
caminho, comprar algumas coisas que faltavam no seu modesto
almoxarifado caseiro. Um sujeito que vai a um mercado pode muito bem
se condicionar a levar consigo uma sacola durável e ecologicamente
correta. Mas o que podem fazer as pessoas que foram a outros
compromissos e, retornando para casa, decidem comprar algo em um
mercado qualquer? O Rogério me confessou que houve vezes em que
entrou em um mercado sem sacola sentindo-se um bandido ecológico.
Com essa resolução, devemos dar um jeito de enfiar
nossas sacolas de pano ou materiais duráveis em algum lugar, na
hipótese de precisar entrar em um supermercado. Enfiá-las no bolso,
na carteira, na cueca... Fico imaginando executivos entrando nas
reuniões matinais com suas pastas e uma sacola de supermercado,
antevendo uma possível comprinha ocasional.
Sou totalmente contra as sacolas à base de petróleo
e tenho consciência de seus efeitos nefastos ao meio ambiente. Na
verdade, não entendo porque esse monstro chegou a ser concebido,
fabricado e difundido por anos. Daí, concluí que são como os
produtos com gordura trans: enquanto conseguiram esconder males
causados à saúde, enfiaram goela abaixo do consumidor. O mesmo com
os venenos contidos no cigarro.
Mas, convenhamos, essa extra-oficial Lei da
Sacolinha deveria ser imposta não ao consumidor, mas sim aos
supermercados, obrigando-os a soluções ecologicamente adequadas
para proporcionar que seus clientes transportem as mercadorias
compradas com conforto e segurança. O que se fez foi transferir a culpa e os
custos ao cliente. Há incontáveis cenas nas quais uma operadora de caixa esnoba um constrangido cliente que não acabou de pagar por um produto e não faz idéia de como irá levá-lo para casa: "Não damos mais sacolas. Por que não veio de casa com a sua?", diz a operadora, com um riso sarcástico no canto da boca.
Tal qual a CPMF, criada para uma finalidade nobre e
desvirtuada após a aprovação. Me desculpem os que acreditam na Lei
da Sacolinha, mas essa resolução nada fará a não ser render um
belo lucro aos donos dos supermercados, livres desse ônus para com
seus fregueses. No dia-a-dia tornou-se simplesmente uma oficialização
de vendas de sacolas a vinte e cinco centavos, que o Rogério
recusou-se a pagar e motivo de ter caminhado pelas ruas equilibrando
papel higiênico e pãezinhos. Duvido que os supermercados abaixem o
preço das mercadorias, já que nesses, continuam embutidos os custos
com as tais sacolinhas que eles nem mais distribuem.
A quem preferir acreditar no conto das sacolinhas um
aviso: nesse mundo, cada problema tem solução. Às vezes, soluções
ridículas de tão fáceis. O grande “porém” é que os problemas
são mais lucrativos que soluções. Há gente ganhando dinheiro com
os problemas. De jeito nenhum permitirá que sejam resolvidos. No
máximo, um paliativo para que tudo continue como está.
Algumas pessoas que lucram com os problemas (não é preciso aqui enumerá-los, pois conhecemos vários) tiveram, há muito tempo, uma solução genial: para garantir que um problema não seja resolvido, assume a tarefa de solucioná-lo. A partir daí, finge que está resolvendo.
Algumas pessoas que lucram com os problemas (não é preciso aqui enumerá-los, pois conhecemos vários) tiveram, há muito tempo, uma solução genial: para garantir que um problema não seja resolvido, assume a tarefa de solucioná-lo. A partir daí, finge que está resolvendo.
Afinal de contas, político existe
para quê? Para resolver problemas não é. Afinal, os problemas são
o seu ganha-pão. Sem problemas, do que sobreviveria?
Com a regra das sacolinhas, podemos fingir que salvamos o planeta.
Eparrei!
Rogério de Moura