Pouca gente
se lembrava do sobrenome original do Gilson. Para todos, o famoso personagem do
bairro chamava-se Gilson Álcool.
Alcoólatra
desde a tenra juventude das primeiras farras. A bebericagem se estendeu por
todos os anos de sua vida, consumindo boa parte do seu rendimento salarial e, é
claro, do seus fígado e pâncreas. Somou-se ao cartel do Gilson as brigas com os
moradores do bairro e com a esposa.
Várias
vezes tentou parar de beber, o que durou, no máximo, algumas semanas. Após, lá
estava ele pendurado em algum balcão, rindo, xingando ou simplesmente dormindo,
mergulhado em seus sonhos etílicos.
Um dia,
decidiu parar. E jurou a todos que a decisão tinha caráter definitivo. Houve os
que duvidaram, outros que chegaram a rir. A esposa, devido a anos de
experiência, manteve-se cética.
A
quantidade de semanas que geralmente impunha um limite à abstinência de Gilson
começou a se estender. Alguns donos de boteco começaram a se desesperar.
Outros, através de gentis conversas e ofertas de maior crédito fiado, tentavam
convencê-lo a voltar a beber. E nada.
Amigos
também não acreditavam. Muitos zombavam de Gilson.
- Vai
voltar. Um dia você vai voltar ao copo de cachaça.
- Juro por
minha mãe! - replicou Gilson.
Contra tudo
e contra todos, Gilson ficou sem beber e as pessoas começaram a admirá-lo, a tê-lo como exemplo de recuperação.
Certo dia,
Gilson foi enxaguar a boca com um antisséptico bucal que continha álcool. A
tentação de beber foi gigantesca. Mas a vergonha em ser visto bebendo depois de
virar o herói abstêmio do bairro era igualmente grande.
E Gil
voltou a beber. Mas dessa vez, longe do bairro. Quando está muito bêbado, volta
para casa de táxi, escondido. Quando a coisa é feia, dorme em algum hotel ou
banco de praça. Voltar bêbado ao bairro, jamais!
A única
pessoa que sabe da recaída do abstêmio mais bêbado do mundo é a sua sempre
cética esposa.
Eparrei!
Rogério de Moura
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