Todos os dias, ele percorria as ruas do centro da cidade,
varrendo as calçadas. Já varreu de tudo: escadas, plataformas de trem e metrô, ruas, prédios e salões. Passou dias e dias em um banheiro público ou de shopping, aspirando os piores odores.
Em todos esses anos, aquele faxineiro nunca soube lidar com a invisibilidade a qual são condenados todos que optam por essa profissão. Ninguém o olhava. Pessoa alguma percebia a sua presença, como se estivesse escondido atrás do vento.
Não se lembrava de, alguma vez, ter ouvido um "bom
dia", um "olá". Uma ofensa que fosse, seria bem vinda. No máximo, alguém tropeçava nele e continuava a caminhar, como se tivesse
topado com uma pedra.
Um dia, foi trabalhar de mau humor e teve o impulso de chutar
o balde: "Se eu sou mesmo invisível, o que aconteceria se eu tirasse a
calça?" Tirou a calça. Nada. Ninguém percebeu. Tirou a camisa. Ninguém
reparou. Estava de cuecas em meio a um mar de pedestres e continuou invisível. Chocado com a
invisibilidade crônica, sentou-se em um banco, desolado.
Habituou-se a varrer as ruas totalmente nu. E
ninguém reparou. Exceto os outros faxineiros. Somente um funcionário de limpeza
para enxergar o outro. E o faxineiro decidiu imitar o colega. Não despertou a mínima atenção.
Com o passar do tempo, outros faxineiros e funcionários de
limpeza começaram a trabalhar igualmente nus. As mulheres, no início relutantes, logo
embarcaram na nau dos nus.
A mídia não percebeu e, portanto, não divulgou. As redes
sociais, surpreendentemente, também desconheceram o MFN - Movimento dos
Faxineiros Nus. À exceção dos funcionários da limpeza pública e particular,
nenhum pedestre, motorista, policial ou político reparou nos funcionários que
ainda continuam trabalhando totalmente despidos nas ruas do centro da cidade.
Há dias em que, quando o inverno é rigoroso, nossos
faxineiros até vestem alguma coisa. Mas no verão, percorrem as ruas
como vieram ao mundo. E não vestiram roupa alguma. A menos que deixem de ser
invisíveis.
Eparrei!
Rogério de Moura