Os direitos do rio

Às vezes, enquanto pito meu cachimbo na varanda de minha casinha de sapê, observando o quintal e os sites no meu lap-top com Windows 98, me flagro atento às formas feitas pela fumaça do meu cachimbo.

Às vezes parecem mapas, algumas vezes o rosto de um conhecido, outras vezes a cara do Ronaldinho Gaúcho.

A fumaça do meu cachimbo, livre, vai ganhando seu espaço no ar, enquanto se dissipa. Na verdade, está se misturando ao ar, tornando-se cada vez mais invisível, indomável como as águas dos rios e córregos.

Ao contrário da fumaça do meu cachimbo, o rio tem uma idade incontável. Há séculos o rio ocupa aquele lugar. Para rio, pouco importa se uma família pobre encontrou como solução construir uma casa às suas margens. Para o rio, nada vale se essa família construiu a vida no lugar. Plantou, acumulou bens de consumo, aumentou os membros da família. Há quantos anos a família vivia nolugar? Um, cinco, dez, vinte, trinta anos... Gerações... Não dá para equiparar aos milênios em que o rio lá existe. E o rio não perdoa. Quando a chuva se intensifica, exige seu lugar de direito.

E lá se vão, em poucas horas, o carro, o fogão, a geladeira, a televisão, o aparelho de som, vidas, as lembranças de família, a casa.

Não adianta tentarmos tomar o lugar do rio. Uma hora, ele nos toma de volta, de maneira trágica. A menos que, futuramente, se invente um aparelho que o transfira para outra dimensão. Mas, com certeza, a novíssima versão do Windows 3015 travaria.

Mas, convenhamos, o rio também tem seus direitos. Ou como diria o ex-ministro Antônio Rogério Magri: "O rio também é um ser humano."

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